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Carmem Miranda nasceu em Casa Nova, no Sertão do São Francisco, e residia com sua família na comunidade de Pau a Pique. Após a construção da Barragem de Sobradinho, nos anos 70, foi obrigada a sair de seu lar para morar a 750 km num projeto de reforma agrária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), na cidade de Bom Jesus da Lapa. Sofreu impactos culturais, sociais, ambientais e econômicos, mas nada disso a privou de se tornar uma revolucionária das políticas do campo.

Foi educada na zona rural, dividindo sua rotina entre escola e trabalho na roça, e tem sua mãe, Dona Maria Anita, como referência de luta. “Minha mãe era uma grande liderança da igreja, então eu cresci vendo ela formando e organizando as mulheres na Agrovila. Cresci nesse meio de luta e organização, é por isso que tenho essa identidade forte em trabalhar com mulheres rurais”, ressalta.

Chegou na Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR) carregando uma bagagem de batalhas pessoais e de experiências profissionais, atuando com produção agroecológica, reforma agrária, capacitações e programas de cisternas, mas sem esquecer do amor pelas políticas de gênero e sua desenvoltura no trabalho com mulheres do campo. Foi assim que ela se encontrou na Superintendência Baiana de Assistência Técnica e Extensão Rural (Bahiater), como coordenadora técnica na Diretoria de Inovação e Sustentabilidade (DIS), monitorando a Chamada Pública Ater mulher.

As mulheres sempre sofreram com a resistência do patriarcado. Alguns órgãos não permitiam que elas participassem de reuniões, associações, e quando participavam era assistindo da janela, do lado de fora. O mesmo acontecia com o trabalho de assistência técnica, que reforçava essas práticas machistas do lugar da mulher, com cursos de bordados e pintura”, lembra a gestora.

A figura feminina sempre foi protagonista no trabalho rural, mas era invisível nas políticas públicas. Foi por meio da educação, da formação e conscientização que o Governo da Bahia deu um grande passo e começou a se inserir a mulher nos espaços de debate e decisão das suas comunidades, colocando-a nesse processo de reconhecimento de ocupação de um lugar não apenas de tarefas domésticas, mas de produtora, comercializadora e geradora de renda.

As mulheres sempre pautaram a SDR’, é o que conta Carmem, e mesmo com os marcos legais da política de ATER na Bahia e no Brasil, sentiam necessidade de uma política de assistência técnica específica para elas, compreendendo os recortes e as cadeias produtivas territoriais. Foi assim que surgiu o ATER Mulheres Rurais, projeto que atende a 5.400 mulheres agricultoras familiares em 10 territórios de identidade da Bahia e, que até o momento, utilizou recursos estimados em mais de 16 milhões nas atividades executadas.

Com a articulação e organização dessa iniciativa, a SDR vem melhorando as condições sociais das mulheres rurais através de um serviço qualificado que perpassa por todas as faixas etárias mas ganha protagonismo com a juventude. “Na chamada de Ater Mulher temos cotas para garantir a participação de mulheres jovens porque é um grande desafio dos Governos do Estado e Federal contribuírem com políticas públicas afirmativas e estruturantes para que essas jovens permaneçam no campo. A jovem, quando ela se sente incluída, quando ela participa das atividades, se destaca, se empodera, fica feliz, entendeu? Diferente um pouco da minha época, que não tinha uma política de ATER como essa. A juventude tem muito a contribuir com o campo e sua comunidade”.

O protagonismo da juventude feminina rural

A 150 km de Salvador, na comunidade Saco dos Mulatos, zona rural de Santanópolis, reside Taíse Fonseca Estrela, uma jovem agricultora apaixonada pelo campo. “Sou agricultora desde sempre. A minha família vem de agricultores e eu gosto muito de morar na zona rural. Me criei, concluí o segundo grau e continuo por aqui. Amo morar na zona rural”. Ela faz parte do conselho da Associação Comunitária dos Agricultores Familiares do Saco dos Mulatos, grupo composto majoritariamente por mulheres, e trabalha com o cultivo de mandioca, milho, feijão, batata, abóbora e hortaliças.

Nascida e criada na zona rural, Taíse conhece as condições de trabalho do campo antes e depois das políticas de assistência técnica executados pelo Governo da Bahia e garante que hoje vive uma ‘experiência muito boa’, diferente do que viu sua avó passar anos atrás. Ela é uma das beneficiárias do Ater Mulheres, projeto que Carmem ajudou a dar corpo até virar política pública efetiva. As histórias das duas se conectam para além do amor à terra: são figuras fortes, inspiradoras e conscientes sobre o papel que desempenham na luta por melhores condições de vida para as mulheres rurais.

Nos tempos da minha avó ela dizia que plantava e não tinha o direito de vender. Só trabalhava para plantar e colher e o marido que governava o dinheiro. O trabalho era demais, plantava de qualquer jeito, não tinha uma orientação. Hoje não. Com a chegada dos projetos de assistência técnica a gente tem orientação de como plantar e da autonomia de vender o próprio produto e ter o próprio dinheiro”, conta.

O Ater Mulheres é mais uma política assertiva do Governo da Bahia. Com o objetivo de dar visibilidade às mulheres rurais, através de acompanhamento técnico e formações essenciais de gênero, ele criou mecanismos políticos-pedagógicos para auxiliá-las. A Caderneta Agroecológica e o uso de Defensivos Naturais são exemplos destes instrumentos capazes de melhorar a produção e ao mesmo tempo tirar da invisibilidade o trabalho feminino, ao tempo que empodera e atesta a importância da atuação da mulher e da juventude na contribuição da renda familiar.

Com a chegada da SDR eu aprendi muitas coisas novas. Uma das que mais me marcou foi os defensivos orgânicos para as pragas aqui do quintal, que a gente lutava muito. Também teve a experiência da caderneta agroecológica, que ajudou na organização da renda aqui no meu quintal. Até então eu sempre produzia em minha propriedade, mas não tinha noção do tanto que eu economizava aqui no meu quintal”, diz a jovem.

O olhar atento do projeto com a formação de gênero impacta e transforma o jeito que a mulher rural se comporta perante ao trabalho, à casa e à sociedade, quebrando os estereótipos e crenças que as limitava. Taíse conta o resultado disso na prática: “muitos temas foram trabalhados aqui para dar um incentivo, um apoio à mulher na sua autoridade. A gente sabe que a gente vive um certo preconceito, discriminação, mas esse projeto ajudou muito às mulheres a se fortalecerem, a terem uma voz, uma autoridade em sua propriedade”.

Essa reportagem faz parte de uma série de matérias especiais que sairão ao longo deste mês de março como reconhecimento da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR) às mulheres que contribuem com as políticas de fortalecimento da agricultura familiar, transformando vidas e realidades de famílias baianas.

Foto: Lucas Gonçalves/SDR

Créditos
Ascom/SDR
Fonte
Bahiater/SDR
Carmem Miranda - Ater Mulheres
Carmem Miranda - Ater Mulheres

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